segunda-feira, 27 de junho de 2016

A Rainha da Bateria e Lulu Adora Histórias



VILA, Martinho da. A Rainha da Bateria. São Paulo: Lazuli Editora, 2009.
MCQUINN, Anna. Lulu Adora Histórias. Rio de Janeiro: Pallas Editora, 2014.

Adelson Oliveira Mendes[1]
Renata Nascimento[2]


Compreender o significado de família, desde seu processo inicial, no que leva-se aos estudos bíblicos até aos estudos críticos, tanto dos mais antigos até aos modernos. Compreender, por exemplo, o papel feminino dentro desse contexto de família desde a Segunda Guerra Mundial, é socializar de acordo o que a doutrina familiar contemporânea exige, os diversos âmbitos que a mulher, independentemente de cor, etnia etc, pode exercer sem diferenciar pequenas entre as grandes responsabilidades. Na família contemporânea, lembrando que tenha filhos ou não o casal, cada vez mais o papel da mulher e do homem vem-se confundindo, até porque essa distinção entre função de homem e função de mulher não deveria existir desde os surgimento das sociedades e não deve existir em plena sociedade revolucionária.
Para coadunar-se a esses pontos e à perspectiva de desenvolvimento para campos maiores, toma-se aqui dois exemplos da nova formação das mentes críticas da sociedade, através da Literatura Infanto-Juvenil, onde tudo se é formado, o trabalho de Martinho da Vila, em sua obra A Rainha da Bateria (2009) e a de Anna McQuinn, Lulu Adora Histórias (2014). Os dois autores colocam assuntos distintos em seus trabalhos, porém, relatam semelhanças e diferenças na realidade do papel feminino, desde a infância até a adolescência e que perpetuam-se à vida.
Lulu Adora Histórias de Anna McQuinn menciona o hábito do pai e da mãe da personagem Lulu em ler e logo podemos deduzir que procura colocá-la dentro dessa cultura, fazendo assim que a pequena Lulu tenha contato com as mais variadas formas de sonhar: “aos sábados, o pai de Lulu a leva à biblioteca/ no domingo à noite, Lulu e sua mãe leem a história seguinte” (McQuinn, 2014). Vejamos aqui a busca por uma formação de diversidade, colocar uma criança de cor de pele negra, sabido pelo pai das desigualdades, tanto no papel feminino quanto a sua imagem, ao contato de imaginação, formando assim um ser que não diferenciará as funções, é educar no sentido de não separar. Em A Rainha da Bateria, Martinho da Vila traz uma ideia oposta à de McQuinn, uma jovem que perde o pai muito sedo, não explicitado o motivo de tal morte pelo autor, e que diante a reação de sua mãe, a personagem D. Luzia quando após a morte de seu esposo, pai da jovem personagem Maria Luisa, interpretamos não ter sido algo muito favorável: “um dia o pai, que já estava velhinho, morreu e ela ficou muito triste. Sua mãe, bem mais jovem, ficou inconsolável e nunca mais sorriu” (VILA, 2009). Seja lá qual tenha sido motivo da morte do pai de Maria Luisa, a mãe da jovem não a permitia sair à divertir. Tinha ainda na personagem D. Luiza um preconceito além do samba, sua imagem enquanto uma família que reside em uma comunidade, uma cidadã que não se permitia enquanto a seu espaço e sua condição: “mãe, me leva lá na quadra? Não. Lá não é lugar para você! Por que mãe? Vejo sempre crianças indo para lá. É meninada de morro, filhos de gente que não presta” (VILA, 2009).
Nota-se aqui a diferença na forma de orientação e contato das duas personagens com a diversidade cultural, a personagem Lulu tem a orientação e participação de seus pais em sua caminhada, ao contrário da jovem Maria Luisa, que decide experimentar o novo sozinha, com sua ânsia de conhecimento e contra sua mãe. A semelhança entre as duas obras reside no contato com a diversidade, a personagem Lulu através dos livros e a personagem Maria Luisa através da música.
A diferença entre os hábitos traz uma certa desigualdade entre as práticas das duas personagens. Os pais de Lulu apresentava-lhe as viagens fantásticas, lugares exóticos, tem experiências para desenvolver as habilidades, como construção etc, imagina ostentando um sapato, “o que Lulu será amanhã?” (McQuinn, 2014). Tais pontos será de grande proveito para o desenvolvimento da criança, porém, alguns pontos não devam acompanhar tais pretensões, por exemplo, o incentivo ao consumismo. A personagem Maria Luisa, é vista pela sua mãe como uma pessoa de mau gostos, comparando aos hábitos de Lulu, pois samba aos pensamentos de D. Luiza é algo inútil, tanto é que não gosta que sua filha faça parte de tal meio: “a mãe entrou na quadra, encontrou a filha sambando e tirou Maria do samba” (VILA, 2009).
Estimular a vontade de conhecimento é sempre favorável a qualquer pessoa. É notável também a diferença de sociedade em que cada uma das personagens vivem, a personagem Lulu teve o desenvolvimento da imaginação desde cedo, algo que segundo Martinho da Vila, Maria Luisa também era muito estudiosa: “estudiosa, com dezessete anos entrou na Faculdade de comunicação para ser jornalista” (VILLA, 2009). Quebrando assim a ideia de que todo “favelado” não tem acesso à educação, colocando a personagem Maria Luisa como uma revolucionária, que além de vencer a barreira de preconceito de sua mãe: “é que dona Luiza perdeu o preconceito, começou a gostar de samba e retomou a alegria de viver” (VILA, 2009). Maria Luisa prova que o motivo de pertencer a uma sociedade que a muito despreza as comunidades, atribuindo termos pejorativos com grande ponto de negatividade, considerando que pessoas, centralizando-se no papel feminino onde as mulheres deve se sujeitar a funções ridículas e contribuir para o reforço do estereotipo já internalizado pela sociedade, não tem futuro, restando apenas o mundo dos vícios ilícitos, não a desmoralizou em perpassar a cultura sambista e ainda revolucionar o papel dentro dessa prática, qual a função de rainha é representada pouquíssimas vezes por personalidades negras: “e Maria Luisa, sambando com muita graça, encantou os batedores. Foi aclamada: Rainha! Rainha! Rainha!” (VILA, 2009).
Tanto em Lulu Adora Histórias quanto em à A Rainha da Bateria, representa os laços de desigualdades na classe social. A personagem Lulu é apresentada a um mundo idealizado pelos seus pais, sendo posta no mundo da xenofilia, quando: “durante toda a segunda-feira, Lulu leva seus amigos a viagens fantásticas e lugares exóticos como Paris e Luanda” (McQuinn, 2014). Uma criança que aprenderá a valorizar o que é de fora e menosprezar a sua própria raiz cultural, um ponto aqui totalmente discrepante no trabalho de McQuinn. Ao contrário da personagem Maria Luisa, que procura primeiro se reconhecer em sua cultura local antes de ter contato com a diversidade, no centro universitário, como já mencionado sua entrada no mundo das comunicações jornalísticas.
Toda essas histórias contribuem como citado no início, para desconstrução do conceito de família que muitos ainda possuem, tornando o entendimento possível de que mulher, negra, também pode e poderá sempre assumir responsabilidade, como internalizado pela maioria da população e pelas grandes mídias, para além de dona de casa e mentora do desenvolvimento dos filhos. Os papeis de homem e mulher já não se vinculam mais à identidade sexual e sim à condição humana e suas circunstâncias. Atribuir à mulher o papel de cuidar do lar e ao homem o de prover o sustento da família não só é um modelo arcaico que remonta às origens do processo civilizatório como soa hoje em dia um estereotipo ridículo.




[1] Graduando em Licenciatura em Letras: Língua Inglesa e Literaturas pela Universidade do Estado da Bahia e Bolsista do programa de Iniciação Cientifica – PIBIC/UNEB.
[2] Professora Doutora da Universidade do Estado da Bahia e orientadora desse projeto.

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